CONSTÂNCIA – 18/04/2010 Fernando G. Bernardes


  1. Introdução

    Larissa e Fernando (2007)

Um dos importantes alvos da nossa vida cristã deve ser a constância[1].  Poderíamos defini-la como a capacidade de permanecer firme[2].  Ser constante significa não oscilar: conservar a fé e a fidelidade a Jesus em qualquer circunstância.

O Salmo número 1 bem sintetiza a constância na ilustração da árvore.  Naquele salmo o justo é comparado à “árvore plantada junto a corrente de águas, que, no devido tempo, dá o seu fruto, e cuja folhagem não murcha; e tudo quanto ele faz será bem sucedido” (versículo 3).  O cristão constante tem o mesmo vigor espiritual na bonança e na adversidade.  Assim como a folha da árvore plantada junto a corrente de águas, seu testemunho nunca esmorece, sua alegria é constante.

Dificilmente há quem não identifique fases positivas e negativas ao longo de sua vida espiritual, ou “altos e baixos”.  Acredito que todos já desejamos ser mais constantes na fé, ao invés de deixarmos subir ao nosso coração a dúvida, a tristeza ou o desânimo.

Temos o costume de classificar os nossos dias conforme os acontecimentos do cotidiano nos aprazem ou nos desagradem.  “Tive um dia péssimo”, “esse foi um ano terrível”, “que fim de semana maravilhoso”, “que férias relaxantes”.   Com expressões como estas avaliamos a nossa vida segundo os nossos sentimentos.

Há dois problemas nessa avaliação pessoal.  Primeiramente, devido ao conhecimento apenas parcial que temos da realidade, não temos condições de afirmar se um acontecimento é bom ou ruim, sob a ótica eterna de Deus.  O que às vezes nos parece uma desventura pode ser uma grande oportunidade para a operação do Espírito Santo.  O correto parâmetro com base no qual devemos julgar todas as coisas[3] é a palavra de Deus, e não o nosso enganoso coração[4].

Em segundo lugar, nosso julgamento emocional freqüentemente contamina o nosso viver.  Quando verbalizamos que um dia está ruim, o trabalho é desagradável, a convivência familiar é difícil, acabamos nos acostumando com a derrota.  Além disso, deixamos que o nosso humor flutue segundo as circunstâncias do dia, conformando-nos com uma explicação racional da nossa insatisfação ou tristeza.  Por conseqüência, consentimos na oscilação da nossa saúde espiritual.

Não é essa a firmeza que Deus idealizou para justo, no salmo citado.  Firmados em Jesus, podemos alcançar constância e progresso na fé, a despeito de qualquer adversidade.

  1. OS ELEMENTOS DA CONSTÂNCIA

A constância e a firmeza eram características destacadas pelo apóstolo Paulo acerca da igreja de Tessalônica.  Nas cartas de Paulo a esta igreja encontramos alguns indícios de como os tessalonicenses alcançaram essa virtude.  Várias qualidades distinguiam o estilo de vida dos tessalonicenses, mas três elementos parecem estar mais diretamente relacionados à constância.  São eles:

  1. Definição

Os tessalonicenses mostraram-se definidos, ao adotarem um estilo de vida consentâneo com os princípios da palavra de Deus, independentemente das tradições religiosas que antes praticavam.

Essa definição pode ser percebida no texto da carta, em primeiro lugar, pela conversão genuína e notória dos tessalonicenses, descrita por Paulo[5].  O ato de “abandonar os ídolos”, mais do que deixar de lado uma conduta errada, mostra-se importante por colocar Deus no devido lugar que lhe cabe em nosso coração: o primeiro.  Paulo observa que houve conversão para o serviço a Deus, o que significa ter havido, da parte dos tessalonicenses, renúncia ao velho homem, para a adoção de uma nova forma de vida, cuja finalidade é aquele serviço.

Além disso, os tessalonicenses, ao receberem a palavra, alcançaram o entendimento de que ela tem autoridade divina e requer submissão[6].  Ao ouvirem o evangelho, não o receberam apenas como uma mensagem bonita, uma filosofia de vida entre outras tantas que se ensinam no mundo.  Os princípios transmitidos por Paulo, ao invés, foram reconhecidos como expressão da vontade de Deus, à qual se deveriam submeter.

A definição pressupõe, portanto, certa solidez de princípios.  Sem estarmos firmados nos princípios da palavra de Deus, não alcançaremos definição.  A falta de princípios, ou o chamado ânimo dobre[7], leva-nos a ceder às atrações do mundo ou às falsas doutrinas[8].  E os sintomas dessa falta de definição são a dúvida e a insegurança.

  1. Propósito[9]

Ter propósito significa empenhar-se em cumprir a sua vocação.  Jesus teve e tem muitos admiradores, mas bem menos seguidores.  Todos temos um chamado, e importa não negligenciá-lo.  Os tessalonicenses, como se vê dos escritos de Paulo, não negligenciaram o seu chamado.  O evangelho não se resumiu a uma novidade teórica.

Os propósitos existem para se concretizar.  Paulo menciona a operosidade da fé[10] dos tessalonicenses.  A fé é dinâmica e deve produzir obras[11].  Nossa fé não deve ser apenas idealizadora, mas sobretudo realizadora.  Deve produzir resultados concretos na nossa vida e na dos outros.

No tocante à nossa vida pessoal, é importante que vivamos aquilo em que acreditamos.  Os tessalonicenses demonstravam essa coerência[12], pois estilo de vida compatível com os princípios aprendidos[13].  Não se tratava de posturas episódicas de santidade.  Viviam para a agradar a Deus à época em que Paulo lhes escreveu a primeira carta, e continuavam vivendo assim, conforme apurado por Paulo na segunda epístola.

Para sermos fiéis ao propósito que Jesus nos estabeleceu faz-se necessário mantermos nele o foco[14], estarmos inteirados de quais são as suas instruções para a nossa vida.  Somos exortados a guardar os pensamentos[15], não nos distrairmos com as circunstâncias.  Nosso cotidiano está cheio de distrações que podem nos afastar do real propósito das nossas vidas.

Quando conscientes do que nos cabe fazer, devemos mirar-nos nos tessalonicenses, quanto à sua busca constante da excelência[16].  Como já disse alguém, o maior inimigo do excelente é o bom.  Desempenhar com o máximo de empenho as nossas incumbências ministeriais, familiares, profissionais etc. denota nossa submissão a Deus e o reconhecimento da necessidade de viver o Seu padrão.  Sobretudo, porém, devemos buscar excelência espiritual.  Vida espiritual estacionada é o primeiro passo para regredirmos na fé.

Muitas vezes nós nos escusamos de atender ao chamado alegando desconhecê-lo.  No entanto, mesmo que ainda não tenhamos vivenciado uma experiência íntima e direta de revelação do Espírito Santo quanto ao nosso chamado, podemos sempre recorrer àqueles que nos dirigem na igreja.  Vemos que os tessalonicenses mantinham este respeito à orientação da liderança[17].  Devemos igualmente estar atentos às ministrações e conselhos de nossos líderes.

A falta de propósito leva-nos a ceder às distrações (cuidados) do mundo.  A seara é grande, e os trabalhadores são poucos.  O tempo do envolvimento na obra de Deus é agora.  Se deixarmos para depois, muito provavelmente seremos sufocados por aquelas distrações, como a semente semeada entre os espinhos[18].  As distrações normalmente são neutras, não são necessariamente pecado em si.  O pecado está, porém, em negligenciar a obra de Deus, nivelando-a com as nossas atividades terrenas.

São sintomas da falta de propósito o desânimo e ausência de frutos.

  1. Contentamento[19]

Costumamos cantar que alegria do Senhor é a nossa força[20].  A força da alegria, para o cristão, está em que ela não depende das circunstâncias.  Nós podemos ser alegres sempre, em qualquer situação, por mais angustiante.

É claro que, por não termos a total compreensão da justiça de Deus, por vezes nos abalamos diante das vicissitudes da vida.  Também é compreensível que passemos por algum tempo de cura, após enfrentarmos uma adversidade, até que a alegria se restaure no nosso coração.  No entanto, devemos pensar na alegria como uma atitude preventiva, que nos preservará nos tempos difíceis.  Afinal, coração alegre não se atemoriza de más notícias[21].

Devemos seguir o modelo dos profetas, quanto à maneira de enfrentar o sofrimento: a felicidade se alcança pela perseverança[22].  O exemplo de Jó retrata com clareza esta verdade.

A falta de contentamento leva, obviamente, à tristeza.  E o sintoma da falta de contentamento é a murmuração, esta mistura de ingratidão com rebeldia, que por vezes acomete até servos experientes, como o profeta Jonas.

  1. CONCLUSÃO

Paulo, o autor, segundo a inspiração divina, da epístola aqui comentada, experimentou como poucos a constância.  Atravessou privações, preconceitos, declínio de status social, prisão, açoites, naufrágio e muitos outros perigos[23].  No entanto, ele se declarou vitorioso, a despeito de todos esses sofrimentos[24].

Como em vários outros aspectos da vida cristã, não existe explicação racional para a alegria e a paz que alcançamos em Jesus.  Parece impossível conservar a alegria em meio à adversidade.  O homem racional não compreende como alguém pode sentir-se honrado por ter sido açoitado por causa do Nome de Jesus[25], mas trata-se de algo real, já vivido pelos que nos antecederam.  Eram homens definidos, que colocaram Jesus em primeiro lugar nas suas vidas.  Cumprir o seu ministério era motivo suficiente para alegrarem-se em Jesus.

Ao invés de nos preocuparmos com os cuidados do dia, devemos zelar pela nossa submissão aos princípios da palavra, concentrando-nos em cumprir o propósito de Deus na nossa vida.  Nas situações adversas em que não conseguimos enxergar um fim proveitoso, devemos recorrer à fé, amparados na promessa de que tudo concorre para o nosso bem, se verdadeiramente estamos empenhados em cumprir o nosso propósito em Cristo[26].

Quando nos alimentamos dos princípios da palavra de Deus e os praticamos, temos o mesmo vigor no estio e na estação dos frutos, e adquirimos contentamento.  Esta é a uniformidade que devemos nos esforçar por alcançar.


[1] “Ora, o Senhor conduza o vosso coração ao amor de Deus e à constância de Cristo” (2 Tessalonicenses 3:5).

[2] Algumas vezes a mesma palavra grega correspondente a constância — upomonh — é também traduzida como firmeza e como perseverança.  Em comentário ao emprego deste vocábulo em 2 Tessalonicenes 1:3, F. Reinecker e C. Rogers afirmam que “a palavra indica um ‘permanecer sob’, isto é, ‘suportar’ as circunstâncias difíceis.  É o espírito que pode suportar as coisas, não só com resignação, mas com uma esperança alegre” (Chave Lingüística do Novo Testamento Grego, Edições Vida Nova, 1985).

[3] “julgai todas as coisas; retende o que é bom” (1 Tessalonicenses 5:21)

[4] “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá?”(Jeremias 17:9)

[5] “pois eles mesmos, no tocante a nós, proclamam que repercussão teve o nosso ingresso no vosso meio, e como, deixando os ídolos, vos convertestes a Deus, para servirdes o Deus vivo e verdadeiro” (1 Tessalonicenses 1:9)

[6] “Outra razão ainda temos nós para, incessantemente, dar graças a Deus: é que, tendo vós recebido a palavra que de nós ouvistes, que é de Deus, acolhestes não como palavra de homens, e sim como, em verdade é, a palavra de Deus, a qual, com efeito, está operando eficazmente em vós, os que credes” (1 Tessalonicenses 2:13)

[7] “Se, porém, algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente e nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida.  Peça-a, porém, com fé, em nada duvidando; pois o que duvida é semelhante à onda do mar, impelida e agitada pelo vento.  Não suponha esse homem que alcançará do Senhor alguma coisa; homem de ânimo dobre, inconstante em todos os seus caminhos” (Tiago 1:5-8).  O ânimo dobre é a alma divida (diyucoV), ou seja, a mente que oscila entre o mundano e o eterno

[8] “para que não mais sejamos como meninos, agitados de um lado para outro e levados ao redor por todo vento de doutrina, pela artimanha dos homens, pela astúcia com que induzem ao erro” (Efésios 4:14)

[9] “Por isso, também não cessamos de orar por vós, para que o nosso Deus vos torne dignos da sua vocação e cumpra com poder todo propósito de bondade e obra de fé” (2 Tessalonicenses 1:11)

“reconhecendo, irmãos, amados de Deus, a vossa eleição” (1 Tessalonicenses 1:4)

[10] “recordando-nos, diante do nosso Deus e Pai, da operosidade da vossa fé, da abnegação do vosso amor e da firmeza da vossa esperança em nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Tessalonicenses 1:3)

[11] Porque, assim como o corpo sem espírito é morto, assim também a fé sem obras é morta (Tiago 2:26)

[12] “Finalmente, irmãos, nós vos rogamos e exortamos no Senhor Jesus que, como de nós recebestes, quanto à maneira por que deveis viver e agradar a Deus, e efetivamente estais fazendo (…)” (1 Tessalonicenses 4:1)

[13] Nós também temos confiança em vós no Senhor, de que não só estais praticando as coisas que vos ordenamos, como também continuareis a fazê-las (2 Tessalonicenses 3:4)

[14] “(…) porque estais inteirados de quantas instruções vos demos da parte do Senhor Jesus” (1 Tessalonicenses 4:1)

[15] “Portanto, se fostes ressuscitados juntamente com Cristo, buscai as coisas lá do alto, onde Cristo vive, assentado à direita de Deus. Pensai nas coisas lá do alto, não nas que são aqui da terra; porque morrestes, e a vossa vida está oculta juntamente com Cristo, em Deus” (Colossenses 3:1-3)

[16] “Finalmente, irmãos, vos rogamos e exortamos no Senhor Jesus que, como aprendestes de nós de que maneira deveis andar e agradar a Deus, assim como estais fazendo, nisso mesmo abundeis cada vez mais” (1 Tessalonicenses 4:1)

“e, na verdade, estais praticando isso mesmo para com todos os irmãos em toda a Macedônia. Contudo, vos exortamos, irmãos, a progredirdes cada vez mais” (1 Tessalonicenses 4:10)

[17] “Com efeito, vos tornastes imitadores nossos e do Senhor, tendo recebido a palavra (…)” (1 Tessalonicenses 1:6-7)

“Porque vós mesmos sabeis como deveis imitar-nos, pois que não nos portamos desordenadamente entre vós” (2 Tessalonicenses 3:7)

[18] “O que foi semeado entre os espinhos é o que ouve a palavra, porém os cuidados do mundo e a fascinação das riquezas sufocam a palavra, e fica infrutífera” (Mateus 13:22)

[19] “(…) posto que em meio de muita tribulação, com alegria do Espírito Santo, de sorte que vos tornastes o modelo para todos os crentes na Macedônia e na Acaia” (1 Tessalonicenses 1:6-7)

[20] Disse-lhes mais: ide, comei carnes gordas, tomai bebidas doces e enviai porções aos que não têm nada preparado para si; porque este dia é consagrado ao nosso Senhor; portanto, não vos entristeçais, porque a alegria do SENHOR é a vossa força (Neemias 8:10)

[21] Não se atemoriza de más notícias; o seu coração é firme, confiante no SENHOR (Salmos 112:1-7)

[22] Irmãos, tomai por modelo no sofrimento e na paciência os profetas, os quais falaram em nome do Senhor.  Eis que temos por felizes os que perseveraram firmes. Tendes ouvido da paciência de Jó e vistes que fim o Senhor lhe deu; porque o Senhor é cheio de terna misericórdia e compassivo (Tiago 5:10-11)

[23] “São ministros de Cristo? (Falo como fora de mim.) Eu ainda mais: em trabalhos, muito mais; muito mais em prisões; em açoites, sem medida; em perigos de morte, muitas vezes.  Cinco vezes recebi dos judeus uma quarentena de açoites menos um; fui três vezes fustigado com varas; uma vez, apedrejado; em naufrágio, três vezes; uma noite e um dia passei na voragem do mar; em jornadas, muitas vezes; em perigos de rios, em perigos de salteadores, em perigos entre patrícios, em perigos entre gentios, em perigos na cidade, em perigos no deserto, em perigos no mar, em perigos entre falsos irmãos; em trabalhos e fadigas, em vigílias, muitas vezes; em fome e sede, em jejuns, muitas vezes; em frio e nudez.” (2 Coríntios 11:23-27)

[24] “Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou.” (Romanos 8:37)

[25] “Chamando os apóstolos, açoitaram-nos e, ordenando-lhes que não falassem em o nome de Jesus, os soltaram. E eles se retiraram do Sinédrio regozijando-se por terem sido considerados dignos de sofrer afrontas por esse Nome.” (Atos 5:40-41)

[26] “Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito.” (Romanos 8:28)

Publicado por Pr. Wilson

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